Friday, November 16, 2018

Terra dos Pesadelos


Não sei como vim parar aqui, nem ao menos me lembro ao certo de quem sou, mas isto fica se repetindo diante dos meus olhos e não sei como parar.

A primeira coisa que me lembro foi de acordar em meu quarto no meio da noite com a luz de uma lanterna apontada para mim. Com a claridade da lanterna diretamente em meus olhos logo após acordar não pude identificar quem estava a segurando.

Percebi que era um ladrão assim que ele a abaixou, eu pude ver a arma em sua outra mão.

_ Nem pense em reagir. Quero apenas seu dinheiro, joias da sua mulher e o que mais vocês tiverem de valor. _Ele disse antes que ela acordasse no meu lado gritando.

Com o grito dela tudo voltou a ficar escuro, mas antes consegui ouvir o barulho do disparo em direção a ela.

Acordo novamente com um barulho vindo da sala, mesmo pensando se tratar apenas de um pesadelo decido me preparar para o que poderia estar por vir.

_ Amor. Acorda! Acho que um ladrão pode ter entrado na nossa casa. _ Eu disse a acordando depressa.

_ Tem certeza amor, pode ser apenas coisa da sua cabeça. _ Ela levanta assustada tentando mentir para si mesma na intenção de manter a calma, pois ela também ouviu o mesmo barulho.

Ao olhar bem para ela algo parecia estranho, ela não parecia ser a mesma pessoa do meu pesadelo. Entretanto o resto estava igual, o ladrão entrou pela porta com uma arma e uma lanterna em suas mãos apontando-as para mim.

 _ Nem pense em reagir. Quero apenas seu dinheiro, joias da sua mulher e o que mais vocês tiverem de valor. _ Ele disse como da última vez.

Antes que ela gritasse ao meu lado eu pulei em direção ao ladrão que desta vez não disparou. Ele simplesmente me jogou em direção ao chão e começou a me bater sem piedade alguma.

Eu estava completamente em pânico com a força que ele possuía e aquele olhar doentio de quem estava se divertindo enquanto observava o meu desespero.

Quase inconsciente fui arrastado para fora do quarto e a última coisa que vi foi ele estuprando minha mulher diante dos meus olhos enquanto ela chorava e gritava por socorro.

Novamente desperto em minha cama, desta vez antes de ouvir o barulho, levanto e vou em direção ao interruptor, mas o quarto continuava escuro, assim como todo o resto da casa.

Ao chegar na sala vejo nosso cão desmaiado na frente de casa e a porta escancarada.

_ De novo não, esse pesadelo não acaba!!! _ eu gritei em pensamento.

Desta vez o ladrão passou por mim como se eu simplesmente não existisse e foi até o quarto com sua lanterna.

Aquilo não podia estar acontecendo, mesmo em um pesadelo. O ladrão agora parecia que havia saído direto de um filme do velho oeste.

Comecei a rir por ter ficado com medo daquilo e sabendo que não passava de mais um pesadelo. Todavia meu estômago começou a se revirar enquanto eu observava a cena da mulher sendo estuprada e depois esquartejada. Havia muito sangue espalhado pelo chão, em cima da cama, nas paredes.

_ Eu sei que você está aí. _ Disse o ladrão pegando novamente sua lanterna.

Eu me arrepiei completamente quando ele disse aquilo, mas respirei aliviado quando ele passou novamente por mim e foi até um homem caído ao lado da cama.

_ Quem é ele? _ eu me perguntei antes de sentir uma dor horrível em meu braço, como se uma lâmina tivesse acabado de atravessa-lo.

Ele estava esquartejando o homem no chão assim como fez com aquela mulher que agora estava completamente diferente de minha esposa.

Enquanto a lâmina da faca cortava a carne daquele pobre homem eu estava sentindo como se eu estivesse sendo esquartejado vivo.

_ Como eu faço para isto parar!!! Não aguento mais!!! _ Eu gritava em agonia enquanto a dor apenas se intensificava.

Mais uma vez acordo em minha cama, sem entender o que estava acontecendo tento desesperadamente acordar daquele pesadelo sem fim. Quando percebo que tudo estava diferente, toda a casa estava diferente, não só minha mulher havia mudado.

_ Amor? _ Eu perguntei tentando senti-la do outro lado da cama, mas quando eu me viro estava sozinho no quarto.

_ O que está acontecendo comigo? Será que eu enlouqueci? Por que não consigo despertar desse pesadelo? _ Naquele momento tantas perguntas sem resposta assombravam meus pensamentos.

_ Bem vindo!!! _ Disse uma voz vinda do outro lado da porta do quarto.

Abri a porta e um vulto negro entrou correndo, em meio à escuridão da noite não consegui ver o que era. Então aquela coisa subiu na cama com um pulo e olhou diretamente nos meus olhos.

_ Que susto você me deu. Cheguei a um ponto que estou me assustando até com um simples gato. _ Eu disse com a mão no peito tentando respirar e acalmar meu coração que parecia que sairia pela boca.

Ele não parecia um gato comum, com seu pelo negro e seus olhos cor de esmeralda que pareciam brilhar em meio à escuridão, olhando diretamente para mim.

_ Como eu havia dito. Bem vindo! _ Disse o gato sentando na cama e coçando atrás da orelha.

_ Agora eu tenho certeza que enlouqueci. Estou realmente falando com um gato? _ Eu perguntei sem acreditar no que estava acontecendo.

_ A resposta é sim, você está falando com um gato, mas não se preocupe. Ou você já se esqueceu de que isto não se passa de um pesadelo? _ Ele disse parecendo zombar de minha surpresa com o fato de estarmos conversando.

_ Se você faz parte dele como sabe que isto é um pesadelo? _ Eu perguntei assustado com o fato do gato parecer saber o que estava acontecendo.

_ Você também faz parte deste pesadelo. Aliás, você nem ao menos sabe o que exatamente é este lugar e o que está acontecendo. Estou certo? _ Disse o gato enquanto se levantava e caminhava pela cama.

_ Quem ou o que é você? E onde estamos? _ Eu perguntei me aproximando da porta atrás de mim.

_ Pode me chamar de Mikha, não se preocupe, pois eu não vou te machucar. Estou aqui para te guiar até a saída do seu pior pesadelo. Bem vindo a Terra dos Pesadelos!!! _ Disse o gato gargalhando enquanto eu adormecia novamente.

Quando acordei estava na cozinha de outra casa completamente diferente, o jantar estava sobre a mesa e eu estava sentado em frente a um prato cheio de comida, mas esta já estava podre, fedendo e com moscas andando sobre ela.

Do outro lado da mesa estava Mikha com uma vasilha com leite fresco, ele olhava para mim enquanto lambia sem leite.

_ O que foi? Não gostou da comida que preparei especialmente para você? _Perguntou ele estranhando minha repulsa por aquela coisa.

_ Por que você está fazendo isso comigo? O que eu te fiz? _ Eu perguntei afastando o prato e me levantando.

_ Estou fazendo o que? Não gostou da comida? Você costumava a gostar quando te preparavam coisas para comer. Você realmente não faz a menor ideia do que está fazendo aqui ou de quem você é? _ Perguntou ele subindo na mesa e caminhando em minha direção enquanto balançava a calda de um lado para o outro.

_ Eu não consigo me lembrar. Se você está aqui para me ajudar então como faço para sair daqui. _ Perguntei completamente confuso e com a mão na cabeça tentando me lembrar de mais alguma coisa que de alguma forma me ajudasse a entender o que estava acontecendo.

_ Acredito que seja culpa deste lugar, ele costuma a fazer esse tipo de coisa com que passa por aqui. Isto torna seus pesadelos mais reais, pois você não sabe o que é real e o que é apenas coisa da sua mente. Mas para sair daqui terá que se lembrar de tudo e eu vou te ajudar. _ Disse ele lambendo a pata como se não se preocupasse com nada naquele lugar.

_ A única coisa que sei até agora é que tem um ladrão que sempre entra em minha casa para me roubar e acaba me matando, o que faz meu pesadelo começar novamente. _ Eu disse.

_ Talvez essa seja a resposta, você precisa descobrir quem ele é e o que ele quer com você. Mas tome cuidado, pois nem tudo aqui é mera imaginação e você pode realmente se machucar. _ Disse o gato me alertando.

_ Como vou fazer para encontra-lo? _ Eu perguntei imaginando uma espécie de emboscada.

_ Eu sei exatamente o que fazer, mas antes já peço desculpas pelo que vou ter que fazer. _ Disse ele se levantando e pulando em minha cabeça.

Suas garras perfuravam violentamente a minha pele enquanto eu me jogava e rolava no chão me debatendo tentando tirar aquela criatura de cima de mim em vão.

Depois de ter que sentir uma dor insuportável enquanto ele terminava de me dilacerar seu golpe final foi em meu pescoço perfurando uma de minhas artérias e me levando novamente ao início daquele pesadelo.

Ao abrir os olhos acordei no que parecia ser outra época, anos no passado, as coisas pareciam passar como um filme, pois as pessoas ao meu redor não podiam me ver ou ouvir.

Primeiramente, vi duas crianças brincando, em seguida vejo a mãe daquelas crianças entrando em casa chorando, se marido e pai das crianças havia acabado de falecer.

Depois tudo ficou escuro e acordei vendo novamente aquelas duas crianças em outra casa com outra família, poderiam ser os tios, ou alguma família adotiva, pois em um momento assistindo aquelas cenas ouvi um dos garotos falar sobre ter fugido de casa.

Nessa nova família os dois apanhavam e eram abusados pelo homem. Não conseguia imaginar o que seria estar na pele daqueles dois. Eis que sinto uma dor na cabeça e começo a me lembrar de algumas coisas.

Quando desperto novamente em um quarto totalmente vermelho, paredes, móveis, chão. Tudo a minha volta era vermelho, com exceção do que estava em cima da mesma, uma arma e uma lanterna.

_ Encontrei o lugar onde esse ladrão se esconde, agora posso pega-lo desprevenido e acabar com este pesadelo. _ Eu disse pegando a arma e a lanterna, mas antes que eu fosse embora senti que já havia estado naquele lugar antes.

Fechei os olhos mais uma vez e acordei novamente em minha cama, como acontecia antes, entretanto eu estava preparado desta vez para enfrentar aquele homem.

Levantei antes de ouvir o barulho da porta da sala, olhando pela janela vi ele com um pano no focinho do nosso cão, depois cortando os fios da energia fazendo com que todas as luzes de casa se apagassem.

Não esperei que ele entrasse, decidi surpreendê-lo o esperando do lado de fora. Já na frente dele eu o encarei e disse que aquela seria a última vez, finalmente esse pesadelo teria fim.

_ Vejo que você descobriu muita coisa desde o nosso último encontro. Acha mesmo que pode me destruir e acordar. _ Ele disse rindo da minha audácia em querer enfrenta-lo.

_ Você é um monstro, rouba, mata, estupra, mas não tenho mais medo de você. _ Eu disse o encarando.

_ Claro que você tem medo de mim.  Eu sou a personificação do seu pior pesadelo, jamais queira conhecer minha verdadeira forma. _ Ele disse ajeitando o chapéu e sua roupa clássica de filmes de velho oeste.

_ O que é você? Você não é só parte do meu pesadelo. _ Eu disse começando a temer quem eu realmente iria enfrentar.

_ Surpreso em saber que não está sozinho em seu próprio pesadelo? Vejo que você aprendeu como viajar dentre essas memórias. Mas eu ainda tenho muito mais poder do que você aqui.  _ Ele disse rindo antes que relâmpagos caíssem.

_ É sério que você vai tentar me assustar com isso. _ Eu disse rindo. _ E como assim lembranças? As coisas que vejo são lembranças?

_Isso costumava a assustar quem passava por aqui. _ Disse ele sessando sua risada. _Sim, o que você vê são lembranças dos crimes que cometi. Mas infelizmente após minha morte fiquei preso neste lugar, mas agora você está aqui comigo e jamais vou te deixar escapar de mim.

_ Vou te destruir, acordar e voltar para a minha vida, enquanto você vai ficar neste inferno para o resto da eternidade pagando pelo que fez. _ Eu disse pegando a arma que havia encontrado no quarto vermelho.

_ Você acha que eu não mereço perdão pelo que fiz com aquelas pessoas? _ Ele me perguntou colocando suas mãos na arma e na lanterna presas em sua cintura.

_ Ninguém jamais perdoaria um psicopata como você. _Eu disse apontando a arma para ele.

_ Vai se arrepender do que acabou de dizer. _ ele disse atirando em mim primeiro e me fazendo voltar do início do pesadelo.

Assim que levantei me deparei outra vez com Mikha me olhando.

_ Vejo que não conseguiu derrota-lo. Vai precisar da minha ajuda, já que eu descobri onde termina esse pesadelo. _ O gato disse mordendo minha camisa e me puxando para levantar da cama.

_ Finalmente vou conseguir sair daqui. No entanto ainda tem uma coisa que eu não consigo entender. Por que aquele homem é o meu pior pesadelo e as memórias dele estão me assombrando? _ Eu perguntei enquanto me levantava.

_ Logo você vai descobrir, mas agora você precisa vir comigo para o lugar onde essas memórias terminam.

_ Antes de acordar eu preciso descobrir quem ele é, o fato dele estar sempre mascarado não me deixa ver seu rosto, mas acho que eu o conheço. _ Eu disse enquanto seguia o gato até a porta.

A última memória daquele pesadelo estava em uma velha casa na beira de um rio, onde vejo uma velha senhora entrando na casa. Continuo seguindo Mikha que agora parecia apreensivo com o que estava por vir.

_ É aqui que seu pesadelo termina, só posso te acompanhar até aqui. _ Disse ele parando em frente à porta da casa.

_ O que acontece lá dentro? Por que você não pode entrar. _ Eu perguntei imaginando o que iria encontrar naquela casa.

_ Não posso mais fazer nada por você, no entanto antes de entrar tenho uma última pergunta para você. Você seria capaz de perdoa-lo mesmo sabendo de tudo o que ele fez com todas essas pessoas das memórias? _ Ele perguntou me olhando com um olhar de esperança.

_ Eu estive na pele daquelas pessoas, eu sei a dor e o desespero que elas passaram antes de morrer. Isso que ele fez não tem perdão. Você o perdoaria? _ Eu perguntei esperando que ele concordasse, porém o gato nada disse, apenas saiu andando sem olhar para trás, mas antes de sai eu percebi uma tristeza em seu olhar.

Mikha desapareceu em meio à neblina que começou a se formar em volta da casa, o que me obrigou a entrar. Já dentro da casa vejo aquele homem tentando estuprar a velha senhora que preparava comida para ele.

Depois ele ainda tentou abusar dos dois meninos que brincavam no chão da sala. Ao ver aquela cena eu o empurrei para longe da senhora e ele pegou uma faca que estava sobre a pia para tentar me matar.

_ Você sabe que apenas um de nós vai sair daqui hoje. _ Ele disse se escondendo atrás da senhora e colocando a faca sobre sua garganta.

_ Solte-a, chega de mortes, o que você quer? _ Eu perguntei tentando acalma-lo.

_ Eu quero apenas o perdão daqueles que eu matei. Apenas isso me libertará desse pesadelo. _ Disse ele com uma voz irônica, parecendo zombar de todas aquelas pobres almas que ele havia desgraçado suas vidas.

_ Eu te perdoo, mas só se você a soltar sem a machuca-la. _ Eu disse imaginando o pior.

_ Tudo bem. _ Ele disse a soltando e vendo-a correr com a família para fora da casa.

_ Jamais alguém seria louco o bastante para te perdoar. Você merece passar a eternidade no inferno, por isso está aqui. _ Eu disse pegando uma espingarda que estava no quarto da moça.

_ Era exatamente isso que eu queria ouvir de você. _ Ele disse me olhando diretamente em meus olhos. _ Você sabe exatamente o que fazer.

_ Como eu sabia que essa arma estava no quarto? _ Eu me perguntei.

_ Você está se lembrando, mas não temos mais tempo para isso. _ Ele disse vindo em minha direção com a faca, sedento por mais sangue.

Eu atirei no peito dele, derrubando-o no chão. Ele não se mexia e parecia morto, foi então que decidi descobrir sua verdadeira identidade e o porquê ele se dizia meu pior pesadelo.

Ao tirar sua máscara vi quem era o verdadeiro monstro e tamanho foi meu espanto quando me vi deitado naquele chão velho regado ao meu próprio sangue. Eu havia matado todas aquelas pessoas.

O motivo pelo qual eu não conseguia despertar era que eu já estava morto e aquele de alguma forma era meu inferno. Ainda não sei quem era aquele gato, mas descobri quem estava se passando pelo meu pior pesadelo.

Aquela criatura se levantou, mas não parecia mais humano, desta vez possuía uma aparência tão horrível que não existem palavras que possam descrever aquilo que estava diante de meus olhos.

_ Eu avisei que você não iria querer conhecer minha verdadeira aparência. Como você mesmo disse um monstro como você não merece perdão e irei te mandar para o seu devido lugar no inferno. _ Ele disse enquanto seus olhos ficavam negros e ele abria um sorriso sádico repleto de dentes prontos para perfurarem minha carne e me dilacerar.

Foi assim que eu conheci o pior lugar onde já estive, a Terra dos Pesadelos, onde habita aquela entidade pronta para tornar seu pior pesadelo real, onde talvez não haja escapatória e você vai passar o resto de seus dias preso dentro dos seus próprios pesadelos.

E você, qual o seu pior pesadelo?


Sunday, September 30, 2018

Demônio da Depressão capítulo 4: Amor de Mãe


    _ Filha? Onde você está? _ Dona Rosa perguntava enquanto me procurava pela casa.

    Chegando na cozinha ela encontra sobre a mesa uma cartela vazia de remédios ao lado de minha carta. Aquelas eram minhas últimas palavras depois da briga que tivemos pouco antes naquele mesmo dia.

    Mas antes que eu diga o que escrevi na carta preciso contar a quem estiver lendo isto tudo o que eu passei na minha vida que me fez tomar esta decisão.

    Meu pesadelo que muitos chamam de vida começou antes mesmo de nascer, com meu pai alcoólatra e minha mãe... QUERIDA MAMÃE... Extremamente ciumenta, não que eu a culpe por isso, a culpa na verdade sempre foi do meu pai que jamais a respeitou, fidelidade não era uma qualidade dele.

    Meu pai foi embora de nossas vidas antes mesmo de me conhecer. Em uma das discussões minha mãe jogou uma pedra nele, que sob efeito do álcool correu atrás dela grávida prometendo matar nós duas naquele mesmo dia.

    Ela pulou pela janela e correu para a casa da minha avó e passou a noite longe daquele monstro que já havia a feito perder outro filho em outra triste ocasião.

    Aquela foi a última vez que eles brigaram antes dele sair pela porta de casa para nunca mais voltar, às vezes me pergunto como seria ter um pai presente, ou ao menos um que não tentasse matar a própria filha depois de uma briga com a esposa. Pena que esta história está apenas no começo.

    Depois que nasci o terror nas nossas vidas começou, pois minha mãe estava sozinha com uma filha recém-nascida nos braços, desempregada e sem dinheiro. Ela se viu obrigada a ir para a casa da minha tia, onde passei metade de minha vida.

    Ao menos tenho algumas boas recordações dessa época, minha tia praticamente me adotou e me dava tudo o que eu precisasse, enquanto minha mãe trabalhava de todas as formas que era capaz para me sustentar.

    Já meu pai, seja lá onde estiver, saiba que uma criança sente a falta de um pai, mesmo que ele nunca tenha ligado para pelo menos saber se estou viva. Eu digo isso chorando enquanto lembro cada abraço que meus colegas da escola recebiam dos seus pais quando eles chegavam para busca-los após as aulas.

    Os anos foram passando e eu fui crescendo, confesso que aprontei muito na infância o que fazia com que minha mãe perdesse a paciência e me batesse. Ela sempre foi uma mulher muito estressada, mas sempre lutou com todas as suas forças para me proporcionar uma vida melhor do que a que ela teve.

    Talvez você que está lendo isto ainda não entenda a razão da minha mãe ter transformado minha vida em um verdadeiro inferno, mas é neste momento que as coisas mudaram completamente.

    Ela conheceu um homem que posteriormente se tornou meu padrasto. Ela deixou se levar pelas suas promessas de uma vida melhor, enquanto eu estava feliz com a ideia de que finalmente eu teria um pai, finalmente um sonho realizado.

    Mal sabíamos que aquele homem era um lobo em pele de cordeiro. Um velho 20 anos mais velho que minha própria mãe transformou minha vida em um pesadelo que eu não era capaz de despertar.

    Assim como meu “verdadeiro pai” ele também começou a brigar com a minha mãe. Em uma dessas brigas meu instinto protetor me fez entrar na frente dele para impedir que ele a agredisse.

    Ele me agarrou pelo pescoço e começou a me sufocar, acho que se não fosse pela minha mãe talvez eu não tivesse passado daquela noite. Por vingança abri seu guarda roupas e cortei todas as suas camisas, esperava que assim ele aprendesse a lição.

    Aos 8 anos de idade ele fez algo que jamais esquecerei, minha mãe havia saído e me deixado a sós com ele. Eu estava na cozinha quando ele chegou com o zíper da calça aberto querendo “um abraço”, mesmo nessa idade eu já sabia de alguma forma que aquilo não estava certo e neguei por diversas vezes.

    Ele começou a correr atrás de mim pela casa, eu estava desesperada, pois sabia que algo horrível iria acontecer e não havia ninguém para me ajudar. Fui abraçada a força enquanto gritava e me debatia, mas ele só ficava me cheirando e me mandando ficar quieta.

    Por Deus alguém bateu na porta naquela mesma hora, o que o fez me soltar. Chorando e completamente aterrorizada eu corri para o meu quarto e me tranquei até que a minha mãe chegasse.

    No entanto minha mãe não acreditou em nada do que eu disse, ele já havia a cegado a ponto dela ficar do lado dele ao invés da própria filha que ela tanto dizia que amava.

    Um ano após o ocorrido o cunhado daquele pedófilo veio nos visitar, assim como ele havia feito esse homem também abusou de mim. Mesmo criança eu já estava começando a desenvolver meu próprio corpo e ele se aproveitou para pegar em meus seios. Ele me vendo assustada coma situação apenas disse em meu ouvido:

    _ Esse será nosso segredinho. Gracinha!

    Para variar novamente minha mãe não acreditou em mim, infelizmente isso é uma coisa que jamais saiu da minha mente e me atormenta até hoje, entretanto isto ainda estava muito longe de terminar.

    Essa é a parte da história que mais um personagem entra, meu querido irmão caçula. Ninguém pode imaginar o que esse menino me fez passar. Minha mãe engravidou daquele velho e dessa gravidez nasceu Gabriel, que para minha mãe era o filho perfeito.

    Depois que ele nasceu minha mãe que já era extremamente agressiva comigo passou a me maltratar ainda mais, eu sentia como se ela não se importasse mais comigo, isso me destruía por dentro.

    Quando eu completei 10 anos as coisas pioraram ainda mais, além de tudo o que eu já havia passado com a minha mãe, agora ela estava com câncer de mama. Na cabeça de uma criança de 10 anos, sem pai, com um padrasto louco e que poderia tentar algo novamente a qualquer momento e principalmente com uma mãe doida e agressiva, mas que eu amava e pensava que iria perdê-la.

    Com o medo de ficar sozinha no mundo acabei entrando em depressão, foi quando o vi pela primeira vez. Aquele demônio com aquelas garras e aquele sorriso doentio que me fez congelar sentada em minha cama.

     _ Olá doce menina! _ Disse ele se aproximando e saindo de dentro da escuridão que tomava conta do meu quarto naquela noite.

     _ Quem é você? _ Perguntei tentando me esconder embaixo da coberta.

     _ Você ainda não me conhece, então permita-me que eu me apresente. EU SOU O DEMÔNIO DA DEPRESSÃO!!! _ Disse ele antes de começar a gargalhar.

     _ Por que você está aqui? O que quer de mim? _ Eu disse chorando completamente assustada.

     _ Não tenha medo garota, foi você mesma que me chamou. Você estava triste com medo de ficar sozinha, agora vou te fazer companhia pelo resto de seus dias. _ Disse ele passando uma de suas garras pelo meu cabelo.

     _ Eu não quero sua companhia. Eu tenho medo de você. _ Eu disse me afastando dele, que agora já estava sentado comigo na cama.

     _ Agora é tarde demais minha princesa! NÃO TEM COMO SE LIVRAR DE MIM!!! _ Gritou ele sorrindo e mostrando seus dentes que agora mais pareciam enormes espinhos prontos para dilacerarem minha carne.

     _ MAMÃE!!! _ Eu gritava desesperada esperando pelo pior, imaginando o que aquele monstro estava prestes a fazer comigo.

     Nessa hora minha mãe entrou pela porta do quarto e me abraçou. Com a luz invadindo o meu quarto aquela criatura desapareceu junto com o resto da escuridão.

      _ O que houve filha? Por que essa gritaria toda? _ Ela perguntou enxugando minhas lágrimas.

      _ Eu vi um monstro aqui no quarto! Ele queria me pegar. _ Eu disse abraçando-a ainda mais forte.

      _ Foi apenas um pesadelo filha. Não tenha medo de monstro nenhum, eu estou aqui para te proteger. _ Disse ela me acalmando.

      _ Mas até quando eu vou ter você? Eu tenho medo de te perder, você é a única pessoa que eu tenho nesse mundo. _ Eu disse voltando a chorar.

      _ Eu não vou a lugar algum. Eu te prometo que vou lutar com todas as forças e vou vencer o meu câncer. Além de que agora você também tem seu irmão. _ Disse ela começando a chorar também.

       Depois daquela noite as visitas daquele demônio passaram a ser frequentes, eu me trancava no quarto e começava a chorar, pois sabia que já sofria tanto com a minha mãe, sem então eu não aguentaria mais. Isto estava alimentando cada vez mais ele.

     _ Você sabe que sua mãe logo estará morta e ninguém mais poderá te proteger de mim. _ Dizia ele como se estivesse se alimentando e se tornando mais forte a cada lágrima que escorria por meu rosto.

    Conforme o tempo foi passando minha mãe foi fazendo o tratamento, ela parecia cada vez pior e mesmo assim EU sempre cuidei dela. Os cabelos dela foram caindo quase ao ponto de não ter mais cabelos para pentear, mesmo assim eu sempre disse como ela era a mulher mais linda do mundo.

    Eu rezei tanto para Deus cuidar da minha mãe, mesmo com aquele demônio me dizendo que eu só estava perdendo o meu tempo e que minha mãe não sobreviveria.

    Minha mãe sofreu muito, mas superou o câncer e com sua recuperação ela pode ter sua vida de volta. Enquanto minha mãe estava com o câncer eu morei na casa da minha tia, onde eu fui a empregada da casa durante 6 anos.

    Na casa da minha tia eu sempre fui tratada como uma filha, mas aquilo mais parecia uma prisão, nunca tive a liberdade nem ao menos para sair com meus amigos, pois ela tinha medo de que eu fizesse algo errado.

    Foi nesse momento que eu tive que fazer uma escolha, ficar na casa da minha tia, continuar presa e obediente como uma gata borralheira, ou voltar para a casa da minha mãe, onde agora vivia a família perfeita, visto que agora a ovelha negra aqui não fazia mais parte.

    Em resumo vou daqui direto a parte que realmente interessa o que realmente me fez querer morrer. Sei que vão dizer que o suicídio jamais é a solução, mas agora já é tarde para voltar atrás.

    Na véspera de um feriado eu estava em casa quando minha mãe começa mais uma discussão, como sempre por uma razão qualquer. Após a discussão ela sai de casa e eu me tranco em meu quarto.

    _ Como eu disse. Você é incapaz de viver sem mim. _ Disse aquele demônio reaparecendo em minha vida.

    _ Pensei que tivesse me livrado de você. _ Eu respondi enxugando minhas lágrimas.

    _ Você jamais foi feliz, eu te acompanhei por toda a sua vida. _ Ele disse.

    _ Eu já fui feliz. _ Eu disse empurrando ele para longe.

    _ Sério? Quando? Quando seu primeiro namoradinho te traiu e a própria amante dele veio te contar? Ou quando você finalmente se cansou de morar com a sua tia e ser humilhada diariamente. O que foi mesmo que ela te disse: Você vai arrumar um filho com um vagabundo qualquer por ai e nunca será ninguém na vida. Isto é o que você chama de felicidade? _ Disse ele zombando de tudo o que havia passado em minha vida.

    _ Minha mãe superou o câncer, você sempre me disse que ela morreria a qualquer momento. _ Eu respondi agora chorando sem controle algum de minhas emoções, eu apenas queria que aquela dor acabasse.

    _ Não sei por que você está tão feliz com isso. Não foi ela mesma que te expulsou de casa quando você perdeu sua virgindade? Não se faça de santa. _Dizia ele me colocando contra a minha mãe.

    _ Sai daqui agora!!! Eu só quero acabar com toda essa dor. _ Eu disse com as mãos na cabeça em completo desespero, talvez ali começasse mais uma de minhas crises de ansiedade.

    _ Eu sei exatamente no que está pensando. Seu namoradinho de São Paulo não vai te salvar de mim, não importa o quanto ele tente. Acredite em mim quando eu digo que o conheço muito bem. Também o visito às vezes. _Disse ele tentando tomar meu celular de minhas mãos.

    _ Por favor me atende. Eu não estou suportando mais. Ajude-me pelo amor de Deus. _ Eu dizia nas mensagens enquanto o demônio ria ao ver que ele não me respondia.

    _ Você realmente confia nesse garoto? Confia de que céus e terra que ele te prometeu são de verdade? _ Ele disse sorrindo e começando a passar aquelas garras lentamente pelo meu corpo.

    _ Eu confio nele!!! _ Eu respondi.

    _ Ele vai fazer a mesma coisa que todos os seus ex-namorados fizeram, pois como sua própria mãe havia dito que você não passa de uma prostituta. Você jamais realizará os seus sonhos. _ Ele disse começando a se irritar.

    _ Eu ainda vou realizar meu maior sonho e você não vai me impedir. _Eu disse me negando a ceder ao que ele queria que eu fizesse.

    _ Você jamais saberá o que é ser mãe. Você sabe que precisará de tratamento para conseguir e nunca vai possuir dinheiro o bastante para isso. Você sabe que ninguém realmente se importa com você. Eu sou sua única companhia até a hora de sua morte. _ Disse ele destruindo minhas últimas esperanças de ser feliz algum dia.

    Agora voltamos ao início da história, onde minha mãe encontra a carta ao lado da cartela de remédios. Na carta eu escrevi:

    “Desculpa mãe, por não ser sua filha perfeita, por não ser filha daquele pedófilo que você tanto ama, por não ser mais virgem até o casamento, por ser a culpada de todas as brigas dentro de casa, por não simplesmente te obedecer em todas as vezes que você tenta controlar minha vida como se eu ainda tivesse apenas 5 anos. Não aguento mais toda essa humilhação, eu sei que sou a causa de todos os problemas da sua vida, não precisa esfregar isso na minha cara. Agora sem mim você finalmente poderá ser feliz ao lado da sua família perfeita a qual eu nunca fiz parte. ADEUS MÃE”

    Minha mãe terminou de ler a carta aos prantos, mas o sentimento de culpa, junto ao do remorso a impediu de ir atrás de mim. Ela de certa forma sentia vergonha do que fez a filha passar.

    Por Deus minha amiga me liga na hora e percebe o estado que eu me encontro. Desesperada ela me leva ao hospital aonde eu cheguei já quase desmaiando.

    Médicos estavam por toda parte, com equipamentos ao meu redor, para medir os batimentos, pressão, entre outras coisas para tentar me salvar. A pior parte foi quando um dos médicos tentou me fazer engolir uma espécie de cano para ter acesso direto ao meu estômago.

    Já sem ar e começando a entrar em desespero eu mesma puxei o cano e feri minha laringe, o que me fez começar a vomitar sangue. Sinceramente nem sei mais se naquele momento eu ainda preferia morrer ao continuar aquele sofrimento.

    Depois disso fui levada a um outro quarto onde fiquei me recuperando do procedimento, mas antes que eu saísse da presença dos médicos eu pude ver aquele demônio na porta. Ele apenas sorriu e desapareceu.

    Mais tarde naquela mesma noite já na casa da minha amiga eu recebo uma ligação.

    _ Amor. Você está bem? Conte-me o que aconteceu? Por favor, me diz que você não fez nenhuma besteira. _ Disse ele desesperado no telefone.

    _ Calma amor, a pior parte já passou. Hoje eu briguei novamente com a minha mãe e tentei me matar, minha amiga me salvou. _ Eu respondi tentando explicar o que aconteceu.

    _ Meu Deus. Eu estou sem reação, não sei nem o que dizer. _ Ele disse tentando aceitar que quase perde o amor de sua vida.

    Eu mandei a foto do meu pulso e o que aquele demônio me fez fazer, minha dor no pulso não chegou perto da dor que senti em meu coração, mas agora eu me sentia melhor ao lado da minha amiga e do desesperado do meu namorado.

    Passei o fim de semana na casa dela e no domingo voltei para casa e fiz as pazes com a minha mãe, depois disso tudo ela parecia um pouco mais compreensiva e passamos a nos entender.

    Uma semana depois da minha tentativa de suicídio minha mãe começa a passar muito mal e eu a levo para o hospital.

    Chegando lá ela começa a ficar cada vez pior e os médicos parecem não saber mais o que fazer.

    Naquele momento eu o vi novamente, mas esta foi a pior de todas as vezes. Com ódio no olhar ele atravessou uma de suas garras no coração da minha mãe que de certa forma apenas aceitou que ele a levasse.

    Apenas eu o via e os médicos acreditaram com foi um  infarto que a tirou de mim. Eu apenas gritava feito louca com ele.

    _ POR QUÊ? O QUE ELA FEZ PARA MERECER ISTO?

    _ Quem você acha que realmente salvou sua vida? Ao ler a sua carta ela entrou em desespero e eu apareci. Sua mãe ofereceu a vida dela pela sua. Por isso não te levei comigo aquela noite.

    _ Eu quero minha mãe de volta!!! _ Eu chorava desesperada abraçada com o corpo dela no chão.

    _ Agora é tarde, mas você agora sabe que ela realmente te amava e foi o amor de mãe dela por você que te salvou. _ Foram suas últimas palavras antes de sumir para sempre da minha vida.

    Hoje eu tenho 25 anos e ainda me lembro do que minha mãe fez por mim, agora eu sou mãe também e prometi a mim mesma que se for preciso eu também dou a minha vida pela de minha filha. Agora eu sei o que realmente significa o amor de mãe.

Sunday, August 19, 2018

Curupira: O demônio da floresta

      Nunca nos preocupamos com nossas florestas, exploramos cada vez mais os recursos naturais e agora a floresta está se vingando de nós. A lenda diz que ele é um demônio que vive nas florestas evitando que nós a destruamos.

      Acho que a crueldade humana com natureza se tornou tão grande que Deus talvez tenha permitido que um dos demônios saísse do inferno para nos atormentar.

    No começo éramos em 15 trabalhadores, estávamos ilegalmente desmatando a floresta amazônica quando encontramos uma tribo indígena que nos alertou sobre o demônio que habita a região.


   _ Vocês não sabem o perigo que estão correndo destruindo este lugar. _ Disse o cacique me olhando como se estivesse implorando.

     _ Muitos além de nós devastam este lugar, você não pode nos impedir, todas essas árvores nos renderão uma fortuna. _ Respondi com uma voz firme, mostrando autoridade perante o que ele dizia.

       _ Ele vai matar todos vocês, ninguém jamais sobreviveu na presença dele. _ Disse o cacique me segurando em meus ombros e olhando diretamente no fundo dos meus olhos.

      _ Você está falando do curupira? Isto é apenas folclore. Ninguém acredita em seres que habitam a floresta protegendo-a. _ Respondi rindo da preocupação do cacique.

     Depois de nossa conversa mandei que destruíssem a tribo e matassem todos os índios, para que não houvessem testemunhas da nossa presença neste lugar. Porém, antes que cortassem sua cabeça com um machado o cacique me disse algo em sua língua que não pude entender e depois completou:

   _ Agora vocês estão todos amaldiçoados. Jamais conseguirão sair dessa floresta, seus corpos nunca serão encontrados!!! _ Dizia o cacique gargalhando sadicamente, como se toda a sua sanidade não existisse mais.

       A gargalhada cessou quando sua cabeça rolou próxima a seu corpo. Fiquei completamente arrepiado, pois naquele mesmo momento o clima esfriou drasticamente e estávamos com uma terrível sensação de estarmos sendo observados.


    Naquela noite tudo começou, a maldição do cacique estava perto de se concretizar. Um dos lenhadores voltava correndo da mata gritando:

        _ EU VI ELE!!! ELE EXISTE!!! Vamos embora daqui.

      _ Então como ele era? _ Perguntei em tom sarcástico, totalmente descrente de seu relato.

   _ Ele parecia um menino com cabelo vermelho. _ Respondeu o homem tentando controlar seu desespero.
       
     _ Depois disso você acordou e descobriu que estava dormindo entre as árvores? _ Perguntei rindo da situação.

        _ Não imbecil. Eu estou falando sério! _ Respondeu ele.

       _ Do que você me chamou? Saiba que eu não estou aqui de brincadeira, ou você esqueceu que estamos aqui ilegalmente? Você por acaso quer passar o resto de sua vida na prisão? _ Disse a ele, furioso com sua atitude.
   
       _ Prefiro a prisão a ficar preso aqui para sempre com aquele demônio. _ Disse ele começando a arrumar suas coisas.

      _ Você não pode simplesmente ir embora. Eu sou o único aqui que dá ordens e você vai me obedecer. _ Disse a ele pegando suas coisas e jogando no chão.

        _ Não preciso da sua ajuda para sair desta floresta, vou usar o GPS do meu celular. _ Disse ele tirando o celular do bolso.

      _ Não vai mais! _ Respondi jogando seu celular no chão, vendo-o despedaçar.

      _ Alguém ainda pode me emprestar o celular. _ Disse ele olhando para todos ao redor, que com a discussão pararam o que estavam fazendo.

     _ Boa ideia!!! Por que você não pede então? _ Disse a ele em tom sarcástico, pois já sabia a resposta dos outros.

      _ Eu não vou te emprestar meu celular, ninguém aqui vai. Você pode muito bem denunciar o que estamos fazendo aqui. _ Respondeu Marcos, falando por todos ali presentes.

    _ Eu não vou ficar aqui para morrer. Encontrarei o caminho por conta própria. _ Disse ele pegando suas coisas e sumindo entre as árvores.

       _ COVARDE! _ Gritei para que ele ouvisse mesmo tão longe.

    Mal sabia eu o erro que estava cometendo ficando naquele lugar. Novamente senti um calafrio percorrendo minha espinha e pude observar uma estranha movimentação na mata próxima à direção que Vinicius partiu.

        Nos dias seguintes mais trabalhadores se queixaram da aparição de um menino de cabelos vermelhos em meio às árvores, em momento algum acreditei que realmente poderia ser o Curupira, mas com tantos relatos decidi averiguar a hipótese de que realmente teria alguém na floresta nos observando enquanto derrubávamos mais árvores.

     Na tarde daquele dia fomos mais para o interior da floresta, em uma região que ninguém havia estado em busca desse ser que nos “assombrava”.


      _ Procurem por qualquer coisa suspeita, pegadas roupas ou qualquer vestígio que um garoto pode deixar. _ Eu disse sem imaginar que pudéssemos realmente encontrar algo que prove sua existência.

   Entretanto um deles encontrou pegadas, elas eram pequenas e havia sido feitas por pés descalços. Decidimos segui-las até encontrarmos seu legítimo dono.

      Após meia hora de caminhada conseguimos chegar a sua origem embaixo da sombra de uma árvore. Procuramos por toda parte esse tal de Curupira, mas não encontramos, nem mesmo no alto das árvores.

       Voltamos para o acampamento agora assustados com as pegadas que vimos dentro da floresta. Ficamos ainda mais assustados quando vimos que as mesmas pegadas estavam espalhadas por todo lugar.

        _ Mas o que houve aqui? _ Perguntei assustado antes que um forte cheiro podre tirasse meu foco da bagunça e visse o que estava logo atrás do acampamento.

        Ao lado da minha barraca estava a cabeça decepada de Vinicius com o machado enfincado eu sua testa, em meio a todo aquele sangue estava escrito na terra:

            “Ele tentou avisar, mas agora é tarde”.


         Completamente aterrorizado com a cena eu disse para que todos arrumassem suas coisas o mais rápido possível para que eles fossem embora antes mesmo que anoitecesse.

       Todos obedeceram e logo partiram do local, deixando até mesmo parte do equipamento para trás pela pressa. Todavia em um trecho da estrada havia uma enorme árvore caída que impedia a passagem dos carros, o que os obrigou a prosseguir caminhando em meio à floresta.

        _ Se formos caminhando por esta estrada chegaremos ao fim dela apenas pela manha, se cortarmos caminho pela floresta podemos chegar antes de escurecer. _ Disse Marcos.


        _ Nem pensar eu entro nessa mata com aquela criatura atrás de nós. _ Respondi vendo todos seguindo Marcos entre as árvores.

    Decidi então segui-los para não continuar a viagem sozinho, lembrando o que havia acontecido com Vinicius. Porém algo estava errado, não importava o quanto caminhávamos parecíamos sempre voltar para a mesma árvore que marcamos com um canivete depois da terceira vez que passamos por ela.


       _ Eu desisto de continuar pela floresta, vou voltar para a estrada. _ Eu disse a Marcos que agora concordava que teria sido melhor continuar pela estrada.

       Todos passaram a me seguir no caminho de volta para a estrada, mas nunca conseguimos encontra-la novamente, continuamos voltando para a mesma árvore.

    Nesse momento nem mesmo o GPS sabia em qual direção seguir, foi quando ouvimos uma risada baixa vinda de trás de uma árvore.

        _ Quem está ai? _ Perguntei quase gaguejando.

       Ele saiu de trás daquela árvore e enfim pude vê-lo com meus próprios olhos. Ele possuía a altura de uma criança, cabelo vermelho e os pés eram virados para trás, o que explica o porquê não conseguimos encontra-lo antes. Não estávamos o procurando no fim de sua trilha, mas no começo.

       O Curupira não disse nenhuma palavra, mas antes que eu pudesse pensar em correr ele pulou em cima de Marcos e pegou o machado que estava em suas mãos.

   Minhas pernas pareciam paralisadas enquanto presenciava aquela cena, com uma voracidade o Curupira esquartejava Marcos, membro a membro. Os gritos de agonia só sessaram quando o machado cortou sua cabeça, assim como ele fez com Vinicius.

     Terminando o que havia feito com Marcos aquele demônio olhou diretamente em meus olhos, seus olhos eram negros como a noite, ele sorriu e correu atrás dos outros que já haviam se espalhado pela mata.

      Minhas pernas finalmente decidiram me obedecer e comecei a correr para qualquer direção longe dele, corri o mais rápido que pude, mas a cada quilômetro que percorria eu encontrava mais corpos e membros decepados espalhados pelo chão.

        Naquele momento todo o chão estava pintado com o vermelho do sangue das vítimas dele. Eu entrei em pânico quando vi o último dos corpos completamente mutilado, o que indicava que eu era o único sobrevivente.

       Certamente ele me encontrará e me matará, posso ouvir o jeito que o mato se move, parece que ele está perto, não posso deixar que esta história seja esquecida.

    Dias depois a polícia encontra apenas a cabeça de Gabriel, em meio ao seu sangue estava mergulhado seu celular já sem bateria, porém ele foi levado para ajudar na investigação do caso.

    Depois de carregado o perito do caso encontra uma mensagem de texto que não chegou a ser enviada, de acordo com a investigação o horário da mensagem coincide com a hora da morte de Gabriel. Na mensagem dizia:

     “Ele está atrás de mim. Não tenho muito tempo, ele vai me matar assim como fez com todos os outros. Tenho que fazer esta mensagem chegar às autoridades para dizer que a lenda do Curupira é real. No entanto a história real é muito mais macabra, na vida real a única coisa que realmente importa para ele é ter sua cabeça como um troféu. Ele me encontrou, ele está sorrindo para mim enquanto se aproxima. Ele vai...”

    A mensagem terminava sem Gabriel ser capaz de terminar o que escrevia, enquanto aos outros permanecem desaparecidos, a única coisa que a polícia encontrou antes que arquivassem o caso foi o machado ensanguentado embaixo de uma árvore que estava marcada por cortes de canivete, junto a uma trilha de pegadas que parecia vir do meio da floresta e terminava no local.


Terra dos Pesadelos

Não sei como vim parar aqui, nem ao menos me lembro ao certo de quem sou, mas isto fica se repetindo diante dos meus olhos e não sei como ...